CARTA À RENOVAÇÃO CARISMÁTICA DE OURO BRANCO



Conselheiro Lafaiete, 10 de março de 2013.

Caros irmãos e irmãs da Renovação Carismática
Arquidiocese de Mariana,

Quando recebi o convite de Dom Geraldo para assumir a responsabilidade de Diretor Arquidiocesano da Renovação Carismática Católica, percebi o peso de tamanha missão e senti que o Espirito Santo escolheu-me dentre os dignos, o mais indigno que se coloca nas mãos de Deus para que Ele me modele e faça de mim instrumento em suas mãos.


Nesta primeira carta gostaria de refletir sobre o nosso carisma missionário, sentimo-nos levados, evidentemente, a dirigir o nosso olhar para a experiência de São Paulo. Interessa-nos, sobretudo, tomar consciência do que esteve na base da sua vocação missionária, como interiorizou esta experiencia do chamado e deu corpo à sua resposta, através dos muitos relatos contidos em suas cartas. Conhecemos muito bem como ele soube conjugar a análise da realidade daquela era apostólica com a forte provocação que ia descobrindo no anuncio da Palavra de Deus. Isto aconteceu, à luz do Espírito Santo, deixando-se interpelar por ele e tentando corresponder ao chamamento que recebera. A sua espiritualidade pessoal, a organização do grupo que se somava a ele – era a sua comunidade – e o seu trabalho estiveram sempre norteados pela preocupação missionária de expansão do Evangelho. Damo-nos conta que o zelo missionário que se apoderou do seu coração foi o eixo, ao redor do qual alinhou as diversas dimensões da sua personalidade e que perpasssou por todos os projetos da sua vida de “apóstolo pela graça de Deus” (cf 1Cor 1, 1). A nossa fé é o resultado desse zelo e do zelo de tantos outros apóstolos que souberam abraçar o convite de Jesus.

No entanto, os tempos mudaram, e algumas das motivações que conduziram São Paulo a uma atividade apostólica incansável já não encontram grande eco em nós. Uma nova visão do homem, um modo diferente de conceber a Igreja e a sua missão, uma sensibilidade ecumênica e pluralismo religioso que eram impensáveis no tempo apostólico, colocam-nos numa perspectiva muito distante da anterior. Isto faz-nos recuperar a essência da nossa missão de Renovação Carismática, para podermos encontrar, a partir do seu exemplo, motivações que hoje digam mais ao nosso coração e encham de dinamismo a nossa atividade evangelizadora. São Paulo continua a ser para nós, chamados a este grupo de experiência e renovação, um ponto de referência fundamental; mas precisamos de aprender a fazer uma releitura adequada e percebermos que ele bebeu também nas palavras de Jesus: “verdadeira água viva”(cf Jo 7, 38).

Devemos nos tornar “Homens ou mulheres que ardem em caridade” e no testemunho da unidade cristã: “Que todos sejam um” (cf. Jo 17,21). São estes os traços que nos irão ajudar a explicitar as motivações, que devem continuar a sustentar e a fortalecer hoje o nosso empenho evangelizador, e onde vamos encontrar inspiração para identificar a ótica, sobre a qual conseguiremos englobar o maior número de atividades apostólicas, graças às quais a Renovação Carismática manifesta hoje, em sintonia com o Documento 53 da CNBB, o seu carisma missionário.


Estamos a comemorando os cinquenta anos do início do Concílio Vaticano II. O Concílio tem, sem dúvida, provocado mudanças radicais no modo de definir a Igreja e a sua missão no mundo. A orientação da comunhão, que encontramos nos documentos do Concílio, convida-nos a viver o mistério da Igreja como uma realidade na qual os diferentes carismas e ministérios, dons preciosos do Espírito, se relacionam entre si, fazendo com que a ela possa continuar a avançar numa maior fidelidade a Jesus e a desenvolver com entusiasmo a missão que lhe foi confiada pelo Senhor. Nela, todos nos sentimos chamados e responsáveis por esta missão, que é necessária e urgente para toda a humanidade.

O Concílio apontou o caminho para o desempenho da mesma missão, que implica abrir-se ao mundo e escutar atentamente as perguntas que ele lança, na caminhada da humanidade e neste momento histórico. Somente através de um diálogo aberto e cordial, o Evangelho chega efetivamente a tocar na vida das pessoas. Trata-se de um diálogo imprescindível para encontrar os caminhos de uma evangelização capaz de penetrar nas culturas dos povos, tal como dizia Paulo VI na “Evangelii Nuntiandi” (EM 20). O Concílio reconheceu a urgente necessidade de aprofundar e de acelerar o percurso do ecumenismo, e de entrar em diálogo sincero com os crentes de outras Tradições religiosas, e com todos os homens de boa vontade. Os direitos humanos, a paz, a justiça, a ecologia e outros temas profundamente humanos encontraram o seu lugar próprio no contexto da evangelização.


Sei que não é momento de fazermos um resumo conciliar, mas quero tão somente sublinhar a importância de não perder de vista aquele espantoso momento de graça, que teve lugar na vida da Igreja. A ação missionária da Igreja viveu, graças a ele, tempos novos. Referindo-se ao Concílio, afirmou o Beato João Paulo II: “A enorme riqueza dos conteúdos e o novo tom utilizado, que antes da apresentação conciliar era perfeitamente desconhecido, constituem quase um anúncio dos novos tempos ” (TMA 20).

A Igreja Latino-americana tem sido pioneira, e as orientações provenientes das suas Conferências Gerais, em Medellín (1968), Puebla (1979), Santo Domingo (1992) e, recentemente, Aparecida (2007), põem em destaque a vida de todas as igrejas daquele continente e estimula o compromisso missionário nas demais. A opção preferencial pelos pobres, o empenhamento no campo da justiça, a recuperação da Palavra de Deus na comunidade cristã, e muitos outros aspectos, têm dado lugar a novas formas de presença eclesial entre o povo e as práticas pastorais que foram gerando um novo modo de ser Igreja.

É verdade que, ao lado disto, subsistem muitas sombras na vida da Igreja que, às vezes, debilitam a credibilidade do seu anúncio evangélico. Mas, a nova forma de conceber a Igreja e sua missão, que surgiu a partir do Vaticano II, tem provocado, sem dúvida, mudanças significativas. Estamos inseridos numa dinâmica nova, que não permite que nos esqueçamos da problemática que advém das realidades culturais e sociais, porque a evangelização acontece, precisamente, no quadro deste diálogo mútuo. O Concílio continua a oferecer-nos uma perspectiva suficientemente lúcida, capaz de abordar as diferentes posições que descobrimos na realidade do mundo atual. Provoca-nos a procurar novas formas de viver o nosso batismo, para que proclame verdadeiramente uma mensagem jubilosa para o mundo de hoje. Entretanto, para que isso aconteça é necessário a nossa unidade.


Que o Senhor nos ajude a sermos mais unidos na oração e na missão e que o Deus da vida nos abençoe,

Pe. Valter Monteiro da Paixão
Diretor Espiritual Arquidiocesano da Renovação Carismática
Pároco da Paroquia Divino Espirito Santo – Ouro Branco MG
Assessor Regional da Pastoral Familiar / Região Mariana Oeste
Psicólogo Clinico

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